Folha de São Paulo
Com o presidente confrontado pela saúde política e pessoal e sua base parlamentar com olhos já voltados para a reeleição, parece que do mato do Congresso não vai sair muito mais que queimadas e fumaça, comuns nesta época do ano em Brasília.
Diante desse prognóstico provável, a campanha eleitoral poderá não ser precedida de votações relevantes e necessárias.
Se, por um lado, a meta de deficit primário em 2017 deverá ser alcançada, o programa de recuperação das contas públicas no longo prazo enfrenta sérias dificuldades para entregar os resultados previstos, sobretudo se a reforma da Previdência não avançar.
Além disso, partes da PEC do Teto já são contestadas no STF, a exemplo do compartilhamento fiscal obrigatório para custeio da saúde.
A mistura de governo sem base popular, coligação parlamentar fraturada, partidos políticos contestados, excesso de judicialização e antecipação do calendário eleitoral não favorece a discussão profunda desses e de outros temas essenciais à retomada do desenvolvimento —que vai além da retomada do crescimento econômico observado neste ano e engrenando para 2018.
É com isto que todos deveriam se preocupar: o risco de assistirmos a mais um voo de galinha, aqueles períodos de expansão que passam rápido, se não forem encarados com coragem os problemas que levaram ao funcionamento precário dos governos.
Não se trata apenas de executar o necessário ajuste fiscal, mas de gastar o dinheiro público com eficiência, focando o investimento, a educação e a inovação.
Isso não se faz somente com medidas macroeconômicas, tipo controle fiscal e política monetária. O que se exige é uma gestão transformadora dos usos e costumes envelhecidos do setor público e transparência nas diretrizes do desenvolvimento.
Como exemplo, tome-se a política de incentivos tributários e de juros, que representam há anos parte considerável das perdas orçamentárias que hoje nos fazem falta.
O papel do incentivo é motivar a iniciativa privada a fazer o que de outra forma não faria, seja pelo custo ou pelo risco, não subsidiar setores empresariais pouco competitivos devido a falhas de mercado ou distorções da política econômica.
Quando se fará tal discussão no país? Exceto por vozes isoladas de empresários e acadêmicos, fala-se muito de reformas no atacado, geralmente com conceitos abstratos.
Pouco se discute sobre o que a nação perde por adiarmos, por exemplo, o que o mundo em geral já fez, ao adequar os benefícios previdenciários ao viés de envelhecimento da sociedade. Cuidaram de protegê-la, não de empobrecê-la. Não foram trâmites fáceis, mas sem vetos insuperáveis nem mágoas incontornáveis.
Países bem-sucedidos nessa frente travaram debates de qualidade sobre questões cruciais até chegar a um consenso —exatamente o que não se vê no Brasil.
A exaustão fiscal expôs um país sem projeto de longo prazo, disfuncional nas políticas públicas e, desde os anos 1980, superado por economias que estavam a léguas de distância.
A carência de lideranças acentuou a prevalência de uma pauta curtoprazista, traduzida em medidas tomadas de forma açodada e sem compromisso com uma nova concepção de desenvolvimento.
A campanha eleitoral de 2018 se apresenta como mais uma oportunidade para o debate sobre esses grandes temas e outros igualmente prioritários. Tais como: a necessidade de disrupção positiva do modelo de educação, a definição do papel da iniciativa privada vis-à-vis o setor público, o restabelecimento das conexões entre o Brasil e a economia global e tantas coisas mais.