Folha de São Paulo
O Brasil convive há décadas com juros extraordinariamente elevados, que empurram para cima tanto o custo da dívida pública quanto os encargos que empresas e famílias pagam para ter acesso ao crédito. Há sinais, porém, de que esse período pode estar se aproximando do fim.
A distensão da política monetária insinua uma era de transformações positivas para a economia, os negócios e a sociedade em geral raramente vista na história do país.
O mercado de capitais tende a florescer, abrindo às empresas a possibilidade de emitir títulos de dívida, como debêntures e commercial papers. O setor privado passaria a contar com alternativas ao BNDES e a um sistema bancário altamente concentrado e sem estímulo para oferecer condições de financiamento mais atraentes.
O mercado de ações segue a mesma tendência. Com juros próximos ao padrão internacional, títulos públicos e aplicações conservadoras apresentam rentabilidade mais modesta, levando parte da poupança nacional a se deslocar para opções de maior risco, como ações e papéis de dívida privada.
Os primeiros sinais desse ciclo virtuoso já aparecem nos dados da Anbima, a associação das entidades do mercado de capitais. Segundo ela, nos primeiros dez meses do ano, as captações das empresas somaram R$ 192 bilhões, 36% acima do mesmo período de 2016.
Vai-se formando o ambiente mais propício ao investimento, seja para expansão de operações já estabelecidas, seja para projetos de maior risco. Essa é a base para promover o empreendedorismo empresarial, em especial as start-ups com forte conteúdo inovador e disruptivo.
Os bons ventos trazidos pela redução dos juros deverão espraiar-se pela economia como um todo. O custo da dívida pública será menor para as contas do governo, contribuindo para a redução do deficit total do Orçamento federal (hoje da ordem de 9% do PIB).
A necessidade de financiamento do Tesouro, que absorve 70% da poupança consolidada do país, deixa a menor fatia para tudo mais -do funding do cartão de crédito ao custeio dos investimentos produtivos. Os juros altos são sintomas destas distorções.
A correção das anomalias permitirá irrigar a economia com mais crédito e facilitar os investimentos. Mas, embora promissor, tal cenário ainda está embrionário. Para se consolidar, exigirá um grande esforço para rever a lógica de uma economia historicamente espremida entre a escassez de crédito com custos e prazos competitivos, em relação aos praticados no resto do mundo, e a carência de um mercado de capitais pujante.
Só o equilíbrio nas contas públicas poderá garantir o advento de juros baixos e estáveis tal como ocorre nas economias avançadas e na maioria dos países emergentes, o que demanda, obrigatoriamente, o avanço das reformas estruturais, em especial a da Previdência.
Mas juros baixos não induzem, por si só, o crescimento econômico. Países com taxas próximas a zero e até negativas, como o Japão, lutam há anos contra a estagnação.
No Brasil, o desenvolvimento sustentado envolve também a remoção de entulhos, como o nó tributário e o isolamento em relação aos mercados globais, que derrubam a produtividade, desestimulam a concorrência e impedem empresas e empreendedores de transformar seus sonhos em negócios promissores.
O avanço nessa direção requer novas lideranças que entendam o que precisa ser feito sem ficar à mercê de modelos políticos antiquados, de visões econômicas do passado, de preconceitos ideológicos e de interesses predatórios que nos tem afastado do que é essencial.
As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.