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Só a pressão da sociedade promoverá o progresso solapado pelos grupos do atraso

Folha de São Paulo


É visível a insatisfação com a demora de soluções críveis para os problemas do país

O país enfrenta problemas graves em todas as dimensões, e é visível a insatisfação nos vários estratos sociais com a demora de soluções críveis e minimamente consensuais, alimentando um sentimento de descontrole e insegurança. E estamos às portas de eleições marcadas menos pelo entusiasmo que pelas incertezas exasperantes.

A verdade, por mais indigesta que seja, é melhor que o autoengano a que nos submetemos há mais tempo que o razoável, acumulando idas e vindas de diretrizes que deveriam ser para a vida toda, como a prevalência do espírito empreendedor sobre o estatismo extrativista da renda nacional e do ensino de qualidade de baixo para cima, e não com a prioridade invertida, gerando uma educação com pés de barro.

O positivo é que já há maior consciência na sociedade sobre quais são e onde estão os obstáculos que interditam o progresso do país, localizados, sobretudo, na gestão pública disfuncional e na captura de parcelas crescentes da renda pela burocracia do Estado e pelos interesses privados correlatos ao atraso que nos castiga.

A questão é se os políticos têm tal percepção. Os eventos recentes sugerem que não. A deterioração do ânimo nos mercados e na sociedade com velocidade surpreendente nas últimas semanas demonstrou o quanto são frágeis a compreensão das lideranças do país sobre a gravidade dos problemas a enfrentar e a fragilidade dos principais fundamentos da economia.

O protesto de caminhoneiros, seguido do tremor do dólar, derrubou o discreto otimismo que permeava a economia desde o ano passado. De projeções de crescimento de 3% neste ano, e até mais, agora se preveem menos de 2% e algo não muito diferente disso também em 2019.

O cenário pessimista, ou mais realista, tem raízes em três pontos.

Primeiro, a percepção de falta de liderança, combinada com atitude tíbia, dos governantes diante dos problemas agudos que afligem o país.

Segundo, a incapacidade das autoridades e dos líderes empresariais de entender a gênese e a profundidade da tríplice crise econômica, política e institucional que nos acomete.

E, enfim, a incompreensão generalizada de que é impossível atender as demandas que vêm de todos os lados, de mais gastos públicos a renúncias fiscais.

Essa é a discussão a fazer, mas estamos em permanente stand-by, ao sabor dos acontecimentos (o Carnaval, a Copa do Mundo, as eleições) e assim vão-se empurrando as decisões, especialmente as difíceis.

É o que estamos a colher: os frutos amargos do atraso em implantar as reformas que já eram necessárias no século passado e hoje nem mais se fala delas entre os países relevantes na hierarquia global. O pior é que até já se colocam em dúvida as condições  de que essas reformas venham a ser realizadas depois do processo eleitoral.

Sem Congresso Nacional alinhado, Poder Judiciário colaborativo e um programa competente, mesmo um governo legitimado pelo voto terá dificuldades de construir o que se faz necessário.

Não há outra maneira: só a pressão da sociedade será capaz de tirar do limbo a modernização solapada por grupos sem interesse na verdadeira transformação das questões nevrálgicas para o progresso inclusivo, como a adequação da Previdência ao viés da demografia, o controle das contas públicas e o fim dos privilégios que dividem o país em castas e deformam a coesão que sustenta a esperança.

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

 

Sobre o autor

Pedro Passos