Folha de São Paulo
Se não contivermos a dívida pública, no entanto, teremos sérios problemas inflacionários
A desvalorização do real tem se refletido em outros mercados, como o de renda fixa, que passou a projetar elevação da Selic ao longo da segunda metade deste ano.
Essa possibilidade, porém, não encontra muito amparo entre os economistas: a pesquisa Focus, do Banco Central, ainda mostra a maioria dos analistas prevendo a taxa de juros no fim do ano a 6,50%.
Em outra pesquisa, apenas 5 dos 44 consultados esperam que o Copom eleve as taxas de juros ainda em 2018. Não fui consultado, mas, caso fosse, seria o quadragésimo na lista.
Há países que aumentaram suas taxas de juros em resposta ao câmbio mais fraco, numa tentativa, provavelmente vã, de moderar a desvalorização. Não é, acredito, nosso caso.
Vale lembrar que, sob nosso regime monetário, a taxa de juros é utilizada para controlar a inflação. Como ainda não inventaram um jeito de os juros afetarem a inflação já ocorrida, o BC tem que se guiar sempre pela sua previsão de inflação, que, como todas as previsões acerca do futuro, tem o desagradável hábito de ser uma coisa sempre difícil.
Difícil ou não, sua projeção mais recente apontava para inflação de 4% no ano que vem, comparada a uma meta de 4,25%, sob a suposição de Selic a 6,5% e câmbio a R$ 3,60.
É verdade que o dólar se encontra agora na casa de R$ 3,70/R$ 3,80, ou seja, está de 3,0% a 5,5% mais caro. Todavia, considerando o repasse do câmbio para a inflação (algo como 0,5 ponto percentual para cada 10% de depreciação), a inflação projetada pelo BC para o ano que vem ficaria bastante próxima da meta.
Se for esse o caso, não há motivo para elevação da taxa de juros, ainda mais quando o BC indica que, “com expectativas de inflação ancoradas, eventuais choques que produzam ajustes de preços relativos devem ter apenas seus efeitos secundários combatidos pela política monetária”.
Traduzido para o português, isso significa que o BC não reagirá ao repasse propriamente dito; apenas ao repasse do repasse, isto é, eventual aceleração da inflação em reação à elevação de preços de produtos exportados e importados.
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Deve ficar entendido que não se trata de licença para ignorar a inflação, posição que marcou a administração anterior, nos levando à inflação na casa de dois dígitos em 2015, bem como inércia considerável no ano seguinte, fenômeno que aumentou em muito o custo da desinflação.
Isto dito, se não mudarmos a trajetória das contas públicas e revertermos a tendência da dívida, enfrentaremos sérios problemas inflacionários à frente. Ou bem resolvemos o conflito por nacos do Orçamento pela política com “p” maiúsculo ou a inflação fará o serviço por nós da maneira que conhecemos e que, graças ao Plano Real, conseguimos superar.
A escolha é nossa, e suas consequências, também.
Não é surpreendente que Ciro Gomes esconda seu completo despreparo por trás do insulto; ao contrário, é um padrão consistente. A surpresa é não conseguir pensar em nada mais original do que “alugado à banca”.
Isto dito, reitero o óbvio: devolver o que se tomou emprestado não é despesa, como, aliás, mostra o Manual de Estatísticas de Finanças Públicas do FMI. Se fosse, teríamos que considerar que tomar dinheiro emprestado seria receita, conclusão no mínimo perigosa.
A única coisa pior do que um candidato que não entende de economia é um candidato que pensa que entende de economia, como aprendemos do jeito mais duro de 2011 a 2016.
As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.