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Qual é o meu voto

Folha de São Paulo


Que os eleitos façam bom uso do apoio que tiverem e não o dissipem com aventuras

O clima de suspense que marca as eleições está maior que o normal, considerando o perfil dos dois candidatos que chegaram até aqui à reta final do rali presidencial e o que aguarda o vencedor.

Ele não terá folga para relaxar nem curtir lua de mel com o eleitor. Os ânimos políticos provavelmente continuarão acirrados, devido ao caráter meio plebiscitário da eleição presidencial, e só tenderão a serenar se e quando existir a percepção de que os problemas básicos que afligem a todos estão sendo satisfatoriamente enfrentados.

Não haverá tempo para gastar com tertúlia acadêmica e ideológica. A paciência da sociedade com a política, a burocracia e com tudo conexo ao desgaste da autoridade pública está por um fio. O anseio é por resultados aqui e agora, sugerem as pesquisas, não no futuro.

O desbalanceamento entre o desejo de mudar sem demora “tudo isso que está aí” e o prazo normalmente lento das reformas necessárias, discutidas democraticamente, talvez seja o maior dos desafios.

É preciso plano, habilidade negociadora, consenso para aprová-lo no Congresso e gente qualificada a executá-lo. Voluntarismo acaba mal, como vimos não faz tanto tempo —e ainda sofremos por isso. Infelizmente, a meu ver, o que tem sido dito pelos candidatos à frente das pesquisas não soa convincente.

Mais do que isso, revela carência de liderança, ingrediente substantivo para a condução de um país dividido.

E há um antecedente a resolver até a posse dos eleitos: superar as relações caóticas entre os três Poderes constitucionais, além da autonomia excessiva, obtida muitas vezes na marra e com ameaças, pelas corporações da elite da burocracia.

Nossos problemas são antigos, mas talvez tenhamos mesmo que passar por tais provações, torcendo para que os eleitos façam bom uso do apoio que tiverem e não o confundam com aval
para aventuras populistas e autoritárias.

É difícil elencar prioridades. Tudo é urgente —do ataque à grave questão da criminalidade à geração de milhões de empregos, além de um modelo de educação que forme jovens aptos a uma vida digna, em vez de alienados do processo produtivo e social.

As demandas da sociedade por um cenário econômico promissor (único jeito de se produzir prosperidade), pelo direito de ir e vir com segurança, por serviços que funcionem e tratem com respeito os que precisem deles não são nem mais nem menos diferentes do que se vê em países emergentes como o Brasil, mas muito mais bem resolvidos.

Um bom ponto de partida será reconhecer o problema, como tem feito o eleitor ao manifestar nas pesquisas o seu desagrado com o que está aí. As reformas essenciais são conhecidas e passam pela atualização da Previdência, pelo fim de privilégios no setor público e da extensa lista de favores a grupos econômicos, pela aplicação intensiva das tecnologias digitais pela gestão pública, tudo de uma vez.

Não é garantido que o governante terá aplausos imediatos, mas o ranger de dentes dos interesses contrariados lhe dará a certeza de que está no caminho certo. Basta começar, perseverar e seguir em frente. Esse é o meu voto.

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Pedro Passos