O enfrentamento das mudanças climáticas decorrentes do aumento das emissões de gases de efeito de estufa (GEE) resultantes das atividades humanas é o maior desafio do mundo para os próximos anos. Ele apenas aumentou com o atual conflito na Ucrânia, que mostrou quão arriscado é depender de combustíveis fósseis baratos sem levar em conta todas as implicações dessa escolha.
Criar estratégias para chegar a uma economia com emissões líquidas zero (ELZ) de CO2 e demais GEE é a maneira mais transparente e efetiva de avançar na agenda climática gerando empregos e evitando a inflação.
O Brasil pode aproveitar seus recursos e experiência para dar um novo impulso à sua economia e criar uma estratégia de desenvolvimento a partir da Agenda Climática e do objetivo de se tornar uma economia ELZ. O que pode acontecer aqui antes da maioria dos países porque nossa matriz energética é mais limpa e vai poder continuar assim.
O relatório “A Agenda Climática e o Novo Desenvolvimento Brasileiro” indica que o país pode crescer nos próximos anos de forma sustentável com a sinalizando de políticas alinhadas à agenda do clima. Esse blog esboça o que pode acontecer em vários setores da economia, que mobilizam de populações tradicionais da Amazônia a grandes investidores, setor financeiro e startups em todo o país.
A maior parte das emissões no Brasil se devem ao desmatamento e à pecuária. Acabar com o desmatamento cortará nossas emissões pela metade sem prejudicar o PIB, e nos dará voz para influenciar a questão climática. Ser um líder nessa arena é crucial para nossa soberania, porque um aumento da temperatura mundial de 2°C ou 3°C terá efeito devastador na Amazônia e no resto do Brasil, ao contrário do que ocorrerá nos países nórdicos.
O espaço para uma agropecuária de baixo carbono vai ficando evidente, com a possibilidade de se diminuir a pressão sobre terras virgens e talvez chegar a um boi zero carbono onde houver políticas e investimento adequados.
A vantagem do Brasil na corrida para o carbono zero já é percebida por investidores e será ainda mais valorizada com o destaque que a segurança energética ganhou. O potencial das nossas fontes solar e eólica excede em muito a demanda interna para os próximos 50 anos, permitindo eletrificar os transportes e até exportar energia limpa através talvez do hidrogênio. Podemos crescer consumindo menos petróleo e liberando mais da produção dessa commodity para a exportação.
A eletrificação dos veículos não precisa deslocar o etanol, porque os carros híbridos são duas vezes mais econômicos que os convencionais e rodam com baterias dez vezes menores do que puramente elétricos. Caminhões elétricos também poderão driblar os obstáculos de grandes baterias contando com a recarga dinâmica nas principais estradas. Mas essa transição nos transportes só será suave e sem perda de emprego se houver clareza nas políticas públicas, segurança de abastecimento e posicionamento inteligente do país no tabuleiro mundial da indústria automobilística.
Há oportunidades de investimentos e novos empregos em muitas outras áreas com potencial de redução do carbono, como o saneamento e a indústria, mesmo onde a descarbonização é difícil, como em siderurgia e cimento. Soluções baseadas na natureza e uma economia circular, com menos desperdício, podem dar respostas a esses desafios quando apoiadas na ciência. Florestas cultivadas, por exemplo, sequestram carbono e são a base de cadeias de produção e agregação de valor que permitem produzir aço zero carbono, diminuir o consumo de cimento e substituir os derivados de petróleo em inúmeros produtos, participando da economia circular com a crescente reciclagem do papel.
As soluções baseadas na natureza também criam empregos de alto valor agregado, em centros de pesquisa de Universidades, na Embrapa e nas inúmeras startups voltadas a aumentar a produtividade da agricultura, reduzir perdas em processos industriais e nos serviços, combater o desmatamento, etc..
Como o Brasil é uma economia de mercado, chegar a emissões líquidas zero será mais fácil com o sinal de preço que mercados de carbono aqui e a nível global podem dar. O setor financeiro já está respondendo à perspectiva de organização desses mercados e à inclusão de temas climáticos na regulação prudencial e de mercado. Assim, vão se juntando os elementos para haver um ciclo de crescimento baseado na agenda climática sem necessidade de grandes gastos públicos ou subsídios, se o governo também ajudar na coordenação das expectativas dos agentes econômicos e seguir políticas que façam essa transição beneficiar toda a população.